sexta-feira, 3 de agosto de 2012

A polícia, um cachorro e a magrela

Um camburão azul e branco chega em velocidade um pouco acima da média, vira bruscamente a esquerda, sobe na guia da calçada e breca abruptamente. A porta se abre, dois policiais pulam do veículo e começam a correr. A cena se passa na minha frente, parada em frente à faixa de pedestre. Em alguns segundos, imaginei a catástrofe. Meu passaporte estava em casa. Olhei ao meu redor, faz tempo que não ouço mais falar em seqüestro relâmpago, assalto à banco ou arrastão. Esfreguei os olhos com as duas mãos. Abri-os novamente para ter certeza que aquilo não era uma alucinação. Calma! Não presenciei mais nenhuma tragédia ou aviões explodindo no céu. Só para relembrar a mazela.
Os dois policiais alemães correm atrás de um labrador sem coleira e solto na rua. Coisa rara aqui por essas bandas como já contei em um post anterior. O cão vem em direção aos dois, balançando o rabo com tanta emoção que o traseiro parecia até mesmo ser embalado por um samba canino. O mantedor da ordem alemã coloca o braço bem em frente ao focinho do animal, deixa-o cheirar para estabelecer a boa vizinhança e, ao tenta pegá-lo, é arrebatado por um pulo do bicho que tenta lamber sua cara! Não vi o desfecho da história, se o coitado do labrador virou sabão inocentemente ou foi encaminhado para o abrigo de cães sem teto até localizarem seus donos. Caminhei para casa pensando o quanto a polícia em Weimar não tem o que fazer.
Lembrei da minha única experiência (bem sucedida) com a polícia alemã! Não, nunca fui parada para mostrar documentos. Copa do mundo 2010. Estávamos animadíssimos antes de ver o Brasil perder para a Holanda. Marcamos todos num biergarten ( péssima tradução para jardim da cerveja) em frente à embaixada da Espanha em Berlim. Chegamos esbaforidos, pedalando rápido para garantir o melhor banco de madeira perto do telão e, se possível, ainda debaixo duma árvore. Largamos as magrelas amarradas num poste baixinho em frente ao consulado. Depois da decepção da seleção, pizzas e cerveja de montão, resolvemos voltar pra casa. Mas eis que onde foram parar nossas bicicletas? Lá vem o guarda com a bandeira da Espanha costurada no uniforme e aquela cara sádica, portadora de um sorrisinho no canto esquerdo da boca. “Ta vendo esta placa ali?”, perguntou. “Aqui é proibido parar e a polícia acabou de passar”.
Pronto, estava indo embora a pé mesmo, afinal, pagar a conta para retirar a magrela do pátio sairia mais caro que comprar uma nova no mercado de pulgas. O problema era mais sentimental com a lata velha que já tinha nos acompanhado em diversos momentos e travessias. Perguntamos então para a garçonete do Biergarten se ela realmente tinha visto a polícia. Meio sem paciência, ela mandou a gente ligar no 112! Sim na própria instituição! Olhei para o celular e para os brasileiros e mexicanos que estavam comigo. “Eu não vou ligar para o serviço policial e perguntar se eles viram minha bicicleta, às 23h”.  O guardinha da embaixada que entendeu o comentário reforçou o lunático conselho. “Anda, liga”!.
-       Polícia de Berlim.
-       Alô, olha, nos estamos em frente a embaixada e nossas bicicletas desapareceram, mas elas estavam em local proibido. Foi nossa culpa, não vimos a placa (observação: é sempre bom assumir a culpa para um alemão!)
-       Ah, vou transferir para o departamento de bicicletas. (surpresa: ah??? Como assim um departamento só disso?)
-       Repetição da mesma ladainha.
-       Que cor são as duas bicicletas? Pergunta a chefe do outro lado da linha.
-       Vermelha e Cinza.
-       Então, atravessa a rua. Pronto? Anda uns 200 metros a sua esquerda. Procura uma árvore. Achou?
Elas estavam lá. Realocadas no local permitido! A policial riu da algazarra e de tanto que agradeci. Eles não só estacionaram as bicicletas novamente como nem pensaram em levá-las consigo para ganhar um troco na liberação! E elas provavelmente foram carregadas porque estavam com a corrente de segurança na roda. Pior, o policial que fez a generosa ação, avisou a central de bicicletas que já sabia do ocorrido, quando liguei para dar queixa!  Bom, a noite terminou por aí. Não encontrei mais nenhum representante da lei no caminho, o que seria perigoso, já que por aqui é proibido pedalar após beber! Dá bafômetro e tudo! E quando eu conto, as pessoas me olham desconfiadas, achando que se trata de "causos"....

Obs.: só pra não dizer que a polícia aqui é um docinho, já tive de desembolsar 10 euros só porque deixamos o carro em frente ao banco (com motorista na direção) e ligamos o pisca! “Esse pisca agora dá o direito de parar onde vocês querem? Na ja... como dizem os bons alemães...

Obs.1. Aquele barulho por causa do labrador..... Agora reparem na quantidade de viaturas só para uma passeata com mulheres e crianças no bairro turco de Kreuzberg! 

Nenhum comentário: